ESTÁTUAS JAZZENTES
voz extraordinária aquela entre silêncio e eco, pujante de avenidas nocturnas.
luzes acendem nas poças de chuva o seu brilho relento
para onde tomba o cigarro emudecido,
restos de desespero, soturna balada de acordes e fumos
disfarce de bruma para a noite dos delitos.
Café Bagdad -- nesta voz extraordinária entre o branco e o negro.
julgo-o filme, não o vejo, oiço as vozes,
os sons, a música, de costas para o cinema.
voz extraordinária que, imagino, trespassa a sombra
contra as paredes, do homem da gabardina negra
nos atalhos do caminho, nas encruzilhadas, e que finca os pés
na arqueologia do devir das grandes metrópoles.
pudesse eu reter toda a música do saxofone em surdina
o voo do sapateado, as palmas ritmadas,
e a voz, essa voz persistente e extraordinária
extraída das apressadas noites de amor
ou no sobressalto do dia nascendo.
também se falava muito de Brenda e de Charlie "Bird"
e depois o piano, adejante, como se fora de outro
tempo -- de outros filmes? -- de outro universo, outro destino
de coração entregue à noite onde dormem os monstros
do dia, como de dia dormem os príncipes da noite
envoltos em poalha de lantejoulas.
voz extraordinária aquela: da mão ao rosto
os olhos rendidos, atentos à música, ao corpo
até à última sílaba musical do silêncio
sábado, 29 de março de 2008
segunda-feira, 24 de março de 2008
#4 João Paulo Monteiro (Ângelo Novo)
DISTANTE
«You'd better run and
join your brother John»
GENESIS
«The Lamb Lies Down On Broadway»
as horas as horas
como sombras
de um silêncio antigo para lá da memória
a minha carne dispersa
retém um nome acometido nas ruas --
thorem
meu irmão john espera-me
nessa noite de todas as viagens
ancoradas por um sopro no tempo
espera-me lá muito longe e nessa estranhada lonjura
é o seu ombro
que espera o meu
os seus olhos que procuram nos meus
reler a mesma indeclinável distância
parto agora
é que as luzes da cidade se extinguem
e os meus passos ecoam por dentro das casas.
«You'd better run and
join your brother John»
GENESIS
«The Lamb Lies Down On Broadway»
as horas as horas
como sombras
de um silêncio antigo para lá da memória
a minha carne dispersa
retém um nome acometido nas ruas --
thorem
meu irmão john espera-me
nessa noite de todas as viagens
ancoradas por um sopro no tempo
espera-me lá muito longe e nessa estranhada lonjura
é o seu ombro
que espera o meu
os seus olhos que procuram nos meus
reler a mesma indeclinável distância
parto agora
é que as luzes da cidade se extinguem
e os meus passos ecoam por dentro das casas.
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The Colony Of Slippermen
domingo, 23 de março de 2008
#3 Levi Condinho
DIREITO À PROPRIEDADE
Sou contra a propriedade privada
há no entanto objectos que são mesmo meus
um garrafão de vinho sempre disponível
discos do Bach do Archie Shepp ou do Zappa
o «Pela Estrada Fora» do Jack Kerouac
as «Poesias» de Álvaro de Campos
o «Ulisses» do Joyce
o «Outono em Pequim» do Boris Vian
o «Eros e Civilização» do Marcuse
a «Apresentação do Rosto» do Herberto Helder
os «Trópicos» do Henry Miller
o «Diário de um Ladrão» do Genet etc. etc.
sobretudo sobretudo
os 3 simpáticos companheiros
que tenho no meio das pernas
Sou contra a propriedade privada
há no entanto objectos que são mesmo meus
um garrafão de vinho sempre disponível
discos do Bach do Archie Shepp ou do Zappa
o «Pela Estrada Fora» do Jack Kerouac
as «Poesias» de Álvaro de Campos
o «Ulisses» do Joyce
o «Outono em Pequim» do Boris Vian
o «Eros e Civilização» do Marcuse
a «Apresentação do Rosto» do Herberto Helder
os «Trópicos» do Henry Miller
o «Diário de um Ladrão» do Genet etc. etc.
sobretudo sobretudo
os 3 simpáticos companheiros
que tenho no meio das pernas
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sábado, 22 de março de 2008
#2 Fernando Assis Pacheco
CHIADO, LISBOA: ESCRITOR À BARRA
"...que há-de haver sempre um Neil Diamond alto de mais perfazendo a destruição do ouvido médio"
"...que da vida levo poucas antes ardesse é o que penso à noite lembranças"
"...que me demoro na contemplação da minudência chamada (disseste?)"
"...que rapidamente um triste"
"...que isto ao menos levo: copos, e esses amigos amargos desfeitos na barra: achas que salvo algum?"
"...que a ideia seria misturar versos de três poetas (Pessoa, Maria Browne, Martin Codax) a ver"
"...que a raça humana filhos parentes deixavas quem à volta de quê"
"...que apesar da alta do custo de vida"
"...que as raparigas novas dão uma vontade de rir ao pé dos abat-jours ó pistautira"
"...que uma vez num malabar estava o Melo Antunes com sono"
"...que jamais beber o próprio peso em espécie Jim Beam's"
"...que tu paraste: parei?: a dita revolução na via uriginária portuguesa: o uriginol!"
"...que fecha às três toda a conversa let's come to Barbados"
"...que à cabeça do fósforo, zzk"
"...que mau grado os apetites por uma literatura ao serviço do puâbo"
"...que somos um funeral"
"...que me resta de ti em pequenas partículas no cinzeiro da Swissair"
"...que há-de haver sempre um Neil Diamond alto de mais perfazendo a destruição do ouvido médio"
"...que da vida levo poucas antes ardesse é o que penso à noite lembranças"
"...que me demoro na contemplação da minudência chamada (disseste?)"
"...que rapidamente um triste"
"...que isto ao menos levo: copos, e esses amigos amargos desfeitos na barra: achas que salvo algum?"
"...que a ideia seria misturar versos de três poetas (Pessoa, Maria Browne, Martin Codax) a ver"
"...que a raça humana filhos parentes deixavas quem à volta de quê"
"...que apesar da alta do custo de vida"
"...que as raparigas novas dão uma vontade de rir ao pé dos abat-jours ó pistautira"
"...que uma vez num malabar estava o Melo Antunes com sono"
"...que jamais beber o próprio peso em espécie Jim Beam's"
"...que tu paraste: parei?: a dita revolução na via uriginária portuguesa: o uriginol!"
"...que fecha às três toda a conversa let's come to Barbados"
"...que à cabeça do fósforo, zzk"
"...que mau grado os apetites por uma literatura ao serviço do puâbo"
"...que somos um funeral"
"...que me resta de ti em pequenas partículas no cinzeiro da Swissair"
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sexta-feira, 21 de março de 2008
#1 João Pedro Mésseder
BILLIE HOLIDAY
Canta e é um barco
canta o barro das águas
Por detrás a nuvem do sono
o silêncio
o algodão
e um grito
(há um estranho fruto
enforcado numa árvore)
Canta
E como se o não quisera
dói e flutua
Canta e é um barco
canta o barro das águas
Por detrás a nuvem do sono
o silêncio
o algodão
e um grito
(há um estranho fruto
enforcado numa árvore)
Canta
E como se o não quisera
dói e flutua
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